quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Cartas a Lucílio: carta 5: como deve comportar-se o verdadeiro filósofo

Então, pessoal! Estou trazendo hoje uma tradução de uma das cartas do filósofo estoico Sêneca ao seu amigo Lucílio. Infelizmente não fiz uma tradução direto do latim e, portanto, é possível que haja problemas com o texto traduzido. prometo que depois  pego o texto original para corrigir possíveis erros.

A tradução italiana que usei para fazer a minha tradução é da edição Tutti gli scritti organizada por Giovanni Reale a numeração em colchetes segue a numeração que está na edição italiana.

Essa carta é importante particularmente aos que como eu se interessam pela filosofia como modo de vida. Nessa carta Sêneca exorta seu amigo a dedicar-se a vida filosófica e lhe dá os passos para que o faça do melhor modo possível. 
Essa carta é na minha opinião um verdadeiro remédio para alma filosófica, nela descobrimos que ser filósofo está acima de aparentar-se com o filósofo, mas de viver como  filósofo no meio das pessoas sendo-lhes uma referência que chama para a virtude, a justiça e o decoro. 

Esta carta traz consigo informações preciosas sobre a psicagogia estoica (a condução da alma por meio de exercícios espirituais) um verdadeiro tratado de espiritualidade filosófica e um convite à filosofia mostrando que o filósofo pode e deve viver com os demais sendo diferente sem ser extravagante. 

Espero que apreciem a leitura desse clássico da filosofia antiga romana.

Brener Alexandre.

Cartas a Lucílio
Carta 5: Como deve comportar-se o verdadeiro filósofo
[1] Que tu te aplicas com empenho, deixando de lado todo o resto, unicamente para melhorar te todo o dia, eu o aprovo e me satisfaço, e não somente te exorto a perseverar, mas lhe imploro. Te advirto, pois, de não fazer nada de extravagante no que diz respeito ao teu estilo de vida, como aqueles que não desejam progredir, mas fazer-se notar; [2] evite vestir-se com desleixo,  deixar os cabelos longos e a barba se aparo, evite declarar ódio aos talheres e de dormir sobre a terra nua; evite todo procedimento que vise somente chamar atenção. O nome da “Filosofia” já é bastante impopular, mesmo quando praticada com discrição: o que será, pois, se começarmos a nos esquivarmos dos hábitos comuns dos homens? Em nosso íntimo sejamos em tudo diferentes, mas o nosso aspecto exterior esteja de acordo com o das pessoas.
[3] A toga não seja brilhante, mas também não seja imunda, não tentamos possuir talheres cinzelados em ouro maciço, mas sequer consideramos sinal de frugalidade não haver em absoluto ouro ou prata. Comporta-te de modo a levar uma vida melhor que das massas, caso contrário acabamos por pôr em fuga e mantemos afastados de nós aqueles que também querem melhorar, e não querendo imitar nada do que fazemos, temendo imitar tudo.
[4] A Filosofia promete bom senso, humanidade e sociabilidade; mas, se nos diferenciarmos muito dos outros na maneira de viver, como poderemos dar-lhes prova? Lembra-te que com o comportamento queremos suscitar admiração e não provocar o riso e o desprezo. Certamente o nosso propósito é viver segundo a natureza: mas é contra a natureza atormentar o próprio corpo, abominar os mais elementares cuidados de higiene, procurar um aspecto horrendo e alimentar-se com alimentos pobres, nojentos e repugnantes.
[5] Como é agradável desejar coisas mais refinadas e por isso é louco para fugir das coisas comuns e de pouco apreço. A Filosofia exige simplicidade, não sofrimento; a simplicidade, por outro lado, pode ser acompanhada de um certo decoro. Me parece justo este critério de medida: a vida combina na justa proporção os costumes do sábio e aqueles da gente comum. Para que todos admirem o nosso modo de viver, e também possam compreender lo.
[6] “E agora? Se comportamo-nos como os outros? Não haverá diferença entre nós e eles?” Haverá muita: quem nos observar atentamente compreenderá que somos diferentes das massas; quem adentrar a nossa casa nos admirará mais do que o nosso mobiliário. Como é nobre aquele que sabe servir-se de pratos de terracota como se fossem de prata, também não é menos certo que se pode servir-se de pratos de prata como se fossem de terracota; é próprio de uma alma débil o não saber suportar a riqueza.
[7] Mas quero compartilhar contigo também o pequeno ganho desta jornada; ler em nosso Hecatão que parar de ter desejos é um bom remédio contra o medo. “Cessarás”, diz ele, “ de ter medo, se cessares de esperar”. Tu me dirás: “como é possível que coisas tão diferentes estejam juntas?” Entretanto é assim meu Lucílio: parece está em contraste, e, ao invés disso, são intimamente conectados. Assim como a cadeia une tanto o prisioneiro quanto seu carcereiro, assim também estas coisas que são tão diferentes procedem de pari passo: o temor tem dentro de si a esperança.
[8] E não me admiro que as coisas se passem assim: ambos estes sentimentos são próprios de um espírito hesitante e ansioso que espera o futuro. A causa primeira de ambos é que não se adaptamo-nos ao presente, mas antecipamo-nos com o pensamento aquilo que ainda está longe; desse modo a capacidade de fazer previsões, que é um bem supremo da condição humana, se transforma em um mal.
[9] Os animais fogem dos perigos que vêem, e uma vez que escapa sentem-se seguros: nós nos deixamos atormentar pelo futuro e pelo passado. Muito dos nossos bens não são prejudiciais; revisitar o passado com o pensamento e estender a mão para o futuro que o antecipa renova o tormento da incerteza; nenhum homem é infeliz somente por causa dos males presentes.

Fique bem!

sábado, 26 de dezembro de 2015

Rascunhos de Cartas

Ainda tenho os rascunhos daquela carta.
Ainda tenho na memória todas aquelas palavras.
É um rascunho passado a limpo.
Palavras esboçadas esquecidas no limbo.

Ainda tenho o balão de coração.
Que você me deu com as tuas próprias mãos.
Queria que fosse o seu amor doado.
Naquele coração inflado.

A carta continha um segredo.
Ela exprimia um desejo.
O rascunho tem muitos erros.
Palavras escritas cheias de medo.

O balão fica sempre à vista.
Mas ele não cura minhas feridas.
Ele guarda um desejo.
Que eu nunca guardei segredo.

Em dois tempos distintos dois amores.
Duas emoções, duas dores.
Na letra tremida o receio
No balão guardado um anseio.

Ainda tenho o rascunho daquela carta.
Ainda guardo na lembrança suas palavras.
Um rascunho, um ensaio.
Poderia ter sido perfeito, mas foi um fracasso.

Ainda tenho o balão de coração.
Guardado com minha afeição.
Um ícone, um sinal.
Será que esse é o final?

Ainda guardo o rascunho daquela carta.
Tantas vezes modificadas,
Tantas vezes ensaiada.
Ainda guardo o seu coração
Disfarçado de balão.

Ainda rascunho aquela carta.
Com palavras que não te disse.
Abrindo a minha alma para que você visse.
Aonde guardo o seu coração.


Brener Alexandre 25/12/2015

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Fome de memórias

Tenho fome de memórias.
E todas as histórias,
Tal como todas as estórias.
Que alimentam tantas almas.

Tenho sede do passado.
Que escorre do marasmo.
Quase sempre deixado de lado,
Por séculos a fio.

Tenho fome de lembranças.
Com todas as suas esperanças.
Um caminho de nostalgia sem fim.

Faminto de sorrisos.
Sedento do teu riso.
Memórias saborosas.
De dias que estão por vir.

E quando a fome acaba,
O vazio me destroça,
Quando a sede vai embora,
A solidão me acompanha.


Brener Alexandre 25/12/2015

domingo, 20 de dezembro de 2015

Alma Estreita


Ah, essas pessoas de alma estreita que não aceitam a opinião alheia.
Esses pobres de espírito no pior sentido sempre com o orgulho ferido.
Alma pequena, fraca e tomada pela covardia.

Ah, essas pessoas de alma estreita que não ouvem a opinião alheia.
Esses miseráveis, carentes de realidade.
Alma pequena embriagada e agressiva sempre ressentida.

Ah, essas pessoas de alma estreita incapazes de conviver com as escolhas alheia.
Essa gente maniqueísta que só conhece dois pólos e duas medidas.
Essas almas covardes projetam nos outros sua própria covardia.

Ah, essas pessoas de alma estreita...
Ó, pobreza de espírito...
Ó covardia travestida de coragem...
Em tua estreiteza não és mais que simples embalagem.
Vazia, estéril, uma ilha.

Ah, essas pessoas de alma estreita que tristeza.
Essa gente que não reconhece a fonte de sua fraqueza.
Essas almas massacradas pela realidade.
Almas destituídas de suas verdades.
Almas que não podem ser percorridas.
Almas que não podem ser preenchidas.
Ainda que estejam vazias.

Ah, essas almas estreitas sempre tão cheias de vazio,

Que é impossível para elas alargar o espírito.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Ausência

Sinto a sua falta todos os dias.
Mas, você insiste em não me escutar.
Quando chamo o teu nome na noite escura.
Quando te grito na amargura.

Sua ausência é presença constante.
Um ciclo, memória redundante.
Eufemismo jactante,
Que me leva a chorar.

Sinto sua falta em cada rua que passo.
Seguindo o compasso,
que me levava a te amar.

Tua ausência em forma de silêncio.
Tua presença travestida de desprezo.
Tua falta manifestação do meu desejo.

Sinto a sua falta de tempos em tempos.
Porém, você insiste em ficar em silêncio.
Quando te chamo noite adentro.
Quando entoo o meu lamento.


Tua ausência é lacuna na alma.
É vazio que dá frio na espinha.
É silêncio que incrimina.
É escuridão que cega.

Tua falta é incerteza.
É anarquia destrutiva.
É frieza corrosiva.
Solidão gelada.

Tua ausência sentida,
Tua falta indesejada.
Solidão é minha sina.
Minha alma foi condenada.

Lava minh’alma elegia,
Liberta o meu coração.
Remove do meu espírito a tristeza
E recolhe o que sobrou do meu coração.


Brener Alexandre 15/12/2015

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Memórias de Dezembro

Engraçado como o mês de dezembro é estranho, não é? Parece que tudo muda durante trinta e um dias. As cores do pisca, árvores natalinas e o céu nublado me trazem muitas lembranças, maioria muito agradáveis. São lembranças de um tempo que não voltará mais. De um tempo esquecido e relembrado apenas nos palácios da memória para parafrasear Santo Agostinho.

Muitas vidas revividas quase que de uma só vez em vários momentos sinestésicos. Entre aromas do passado e sentimentos do presente uma lacuna no tempo que se explica pela sua atemporalidade que é outra forma de falar da eternidade.
Lembranças de risadas e ensaios, novenas e festas que agora são apenas lembranças fotografias amareladas impressas na memória, penduradas na parede do grande salão que torna atemporal os momentos efêmeros dissolvidos na ampulheta do destino dos mortais.

O fim das aulas é o núncio das festas, o arauto da alegria ainda que entre as férias e o fim das provas estivesse um boletim que assumia o papel de passaporte e salvo conduto da consciência dos que queriam terminar o ano com a sensação de dever cumprido. Ainda sinto o cheiro da chuva a molhar a terra do quintal da minha antiga morada, ainda vejo a jaboticabeira carregada e a mangueira florida. Quantas vezes não me sentei na goiabeira tomando do seus frutos como verdadeira ambrosia, alimento reservado aos deuses, eu um mortal criava como Prometeu de uma simples goiabeira o doce alimento divino, alimentava o corpo e o espírito alimentava a criatividade para os jogos com meus amigos.

Ah, a melhor parte do mês de dezembro era estar com os amigos, poucos, mas valiosos, o tempo efêmero se tornava eterno quando estávamos juntos. Cada jogo, cada brincadeira, cada momento parecia que não ia terminar. Não havia sensação de perda, ou de frustração, tudo era gratificante, sinto falta desse tempo, sinto saudade daquela época.
Naquele tempo a vida parecia uma vinheta da Cartoon network no melhor estilo que as vinhetas dos anos 90 desse canal poderiam oferecer a uma criança de 10 anos à época.

O mês de dezembro com suas cores e clima, com suas pelejas e sinas carrega traços marcantes de um tempo que não volta, do tempo que não para. Olho a árvore enfeitada na sala e me pergunto quantos natais ainda verei? Penso e medito um pouco sobre o passado, sobre o que fui e o que se perdeu pelo caminho entre tantas lacunas no espaço-tempo. Partes de mim foram deixadas para trás, o menino se tornou um adulto, o adulto tem ainda algum traço do menino?
Me sinto perdido diante das memórias, queria morar nelas se pudesse para sempre. Me encontro nelas mais do que gostaria. “Ah, vida real! Como é que eu troco de canal?” canta o poeta gaúcho. No mês da sinestesia, da lembrança dos cheiros, e das imagens imortalizadas na mente, eu também quero por alguns momentos trocar de canal, para o canal do pretérito perfeito ou mais que perfeito dos anos dourados em que o tempo passava, mas parecia não ter fim.

E para quem não se lembra das vinhetas deixo aí uma cortesia extraída do youtube, não tem todas as vinhetas antigas, mas tem a maioria delas. aproveitem!

Brener Alexandre 09/12/2015

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Reverência

Um encontro inesperado e uma pausa.
Um olhar tímido que soçobra.
Me curvo de respeito.
Com pudor no peito.

Um encontro que assusta
E um sorriso que tranquiliza.
E a voz vacilante,
Suavemente lhe responde.

Um abismo nos separa.
É o tempo que não para.
E o meu medo, covardia,
Angustia e agonia.

Um encontro inesperado
Pelo tempo reunido
E o silêncio no intervalo
E o gesto recebido.
Reverência proferida.
A mulher respeitável.
Reverência merecida
A mulher admirável.

Um encontro casual
Que o destino preparou
E o respeito e a reverência
Acolhidos sem temor.
E o medo que sentia
Não era covardia.

Era falta de chão
Era falta de mão
Era falta de pão
Era medo de rejeição.

domingo, 15 de novembro de 2015

Phoné

Nossas vozes se encontram entre tantas vozes dissonantes.
Entre timbres variados e sons desconcertantes.
Exprimem emoções e aspirações misteriosas.
Vozes que se encontram entre alegrias ruidosas.

O som da tua voz em mim vibra quando me toca.
Me traz felicidade alegria e me reconforta.
Tua fala segura me abraça em segredo.
Revela ao meu coração uma porção de desejos.

E a minha voz como lhe toca?
Te traz arrepios ou lhe arranca suspiros?
Produz o sorriso ou dá calafrios?

Nossas vozes se encontram cheios de confiança.
No tom adequado que cabe a esperança.
Exprime sua caminhada, sua trajetória de vida.
Fala da tua história menina entusiasmada.

E a voz do poeta que vos escreve...
Quando lhe fala teu sangue ferve?
Quando recita, teu coração palpita?
Te provoca alegria ou é pra ti uma desdita?

Tua voz me encanta mais que o canto de Yara.
Corta a minha tristeza como navalha afiada.
Transforma o pensamento em poesia
Emoções em versos
Palpitações em fantasia.


sábado, 14 de novembro de 2015

3° Lei de Newton

Escreveu Sir Isaac Newton na grande obra Principia Mathematica “A toda ação há sempre uma reação igual ou, as ações mútuas de dois corpos um sobre o outro são sempre iguais e dirigidas a partes opostas” (Newton, 2008,p.54).

Todos conhecem a 3° lei de Newton, a lei da ação e reação. Ela diz que se eu der um soco em uma parede a dor que vou sentir é proporcional a força com que a minha mão a atingiu. A dor parece maior, é verdade, mas é proporcional.
 Acontece é que a minha mão é feita de um material menos resistente que a parede e, portanto, passível de sentir mais os efeitos da força reativa do que a parede sentiria em termos destrutivos a força ativa do golpe desferido. (como contra exemplo a parede sente o dano ao ser golpeada por uma marreta e se deixa destruir, quando a marreta não parece ter sofrido absolutamente nada).

Mas, por que falar da 3° lei de Newton? Em que ela nos ajuda a pensar os problemas éticos e sociais que tem envolvido a humanidade recentemente?
Porque, penso, a lei de Newton mais poderosa que a lei de Murphy não diz apenas sobre força de ação e reação e o impacto que isso tem sobre os corpos, mas diz também sobre a força de ação e reação das nossas escolhas morais e do impacto que provoca sobre a nossa sociedade.

Explico: A polarização recente na política e seus contrastes visíveis principalmente nas redes sociais é um fenômeno que pode ser explicado pela 3° lei de Newton.  Quero dizer que pode ser compreendido, e não que é capaz de avaliar quem está certo ou errado na história. O EI (Estado Islâmico) e seus ataques também podem, penso ser explicado por essa maravilha da física moderna.
Se há uma força de mudança haverá na mesma proporção uma reação conservadora (pode ser conservadora em sentido positivo, ou reacionária na contramão do pensamento revolucionário e, portanto, em sentido negativo), se há uma força violenta haverá uma resposta a altura. É isso o que tenho pensado recentemente observando os fatos.

Pessoas ao fazer escolhas morais, ao se engajarem em projetos sociais, ao escolher esta ou aquela ideologia produzem os efeitos da 3° lei de Newton. Porém esses efeitos não são imediatos, pode ser que a resposta venha no mesmo instante, pode ser que a resposta venha ao longo de meses ou anos, mas ela vem.
E vem na forma do ressentimento, da covardia, do medo, do irracionalismo e de inúmeras formas de violência. A palavra que agride, que projeta, que recusa até a violência física e a negação dos direitos básicos do outro.

Suprimir a alteridade até silenciá-lo. E tal como a mão que dói ou a parede que é feita em pedaços pela marreta também aquele que resistir ao choque de forças antagônicas permanecerá de pé. Mas deveria ser assim?

Se como disse o filósofo Eric Weil escapamos à violência e ao medo ao sermos racionais, pergunto-me quando, então, seremos racionais? É verdade quem nem todos estão abertos ao diálogo, que nem todos almejam à paz, mas e então? Eis o paradoxo do humanismo, como lidar com a alteridade que não reconhece o outro? Como permitir o reconhecimento ético? Duas alteridades que se afirmam e se respeitam, duas alteridades, posto que um é sempre outro para o outro. O reconhecimento é um dos grandes desafios da ética contemporânea e da filosofia política contemporânea. A violência é a resposta que subjaz à falta de diálogo, não apenas a violência física, mas a violência verbal à discriminação de todo o tipo também são violências nossas de cada dia.

A 3° lei de Newton se torna cada vez mais perceptível para mim, ela explica a natureza dos corpos e das gentes será que haverá algum meio de escapar de tal lei? Ou de minimizar os efeitos dessa lei?


Edição da Principia Mathematica usada:


NEWTON, Isaac. Principia: Princípios Matemáticos de Filosofia Natural Livro I. trad: Trieste Ricci, Leornado Gregory Brunet, Sônia Terezinha Gehring, Maria Helena Curcio Célia. São Paulo: Edusp, 2008 2° edição.

Ponte de Palavras

Para atravessar o rio de silêncio ergo uma ponte de palavras.
Com cordas de pensamento e suporte de sentimentos.
Entre verbos e adjetivos e um sujeito indeterminado.
Entre o pensamento e a voz que materializa as ideias.

Palavras desajeitadas se seguram a qualquer custo.
Se a ponte se romper irrompe o ruidoso silêncio.
Rio sem riso vazio que angustia.
Palavras que morrem afogadas em agonia.

Palavras vacilantes dizem e nada dizem
Se a ponte balança muito é por medo do silêncio que me agride.
Águas que passam rápido num curto espaço de tempo.
Palavras amedrontadas por causa do agitar dos ventos.

Ponte de palavras instrumento limitado.
Rompe com o silêncio e configura o significado.
Ponte de palavras pinguela dos necessitados.
Por cima do silêncio liga sujeitos e predicados.

Palavras que se ligam como os elos de uma corrente.
Se tornam caminho para as vozes recorrentes.
Tudo flui e a palavra é massacrada pelo movimento.
Ponte frágil de palavras sobre o rio de silêncio.

Como Crátilo a ponte de palavras aponta o sentido.
Anuncia aquilo que com o silêncio é desdito.
Um dedo fala muito ao indicar a direção.
Como a ponte de palavras que possui duas mãos.
Duas direções necessárias para se fazer entendido.
A palavra é desnecessária se não houver algum sentido.

A ponte de palavras estabelece a relação.
Que o abismo de silêncio engole com a solidão.
A ponte é simples necessária e urgente.
Periga por cima do rio que separa as gentes.

Uma ponte feita para ligar os espíritos
Almas isoladas e corações contritos.
Que o silêncio aparta como rio intransponível.
Engolindo amores e amigos.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Bela Vênus

Estrela matutina brilha antes do sol nascer.
Anunciando o novo dia que está para acontecer.
Uma deusa reluzente que possui fases como a lua.
Encanta quem lhe olha manifestada na aurora.

Estrela vespertina brilha antes de escurecer
Segue o sol devagarinho até desaparecer.
Divina e discreta brilha na linha do horizonte.
A deusa do amor que se coloca como ponte.

Entre tardes e manhãs
Entre escuridão e luz
Um trajeto do infinito
Se liga feito circulo
Limite dos destinos da estrada do zodíaco.

Bela Vênus deusa grega passeia na biga divina
Velando pelos mortais que seguem a sua sina.
Bela Vênus flor belíssima da abóboda celeste.
Faz o teu caminho leste-oeste.

Tua beleza, Vênus divina, toca o nosso intelecto.

De fato, deusa luminosa, tu és a flor mais bela do universo.

Era apenas um pedido

Era apenas um pedido, uma súplica, um clamor.
Não te fiz violência com as minhas palavras de amor.
Uma confissão corajosa em meio a intempestivo sofrimento
Um simples pedido feito em tom de lamento.

Era apenas um pedido delicado e suave.
Um pedido sincero feito com amor de verdade.
Pedidos e súplicas nem sempre persuadem.
Não ordena e nem se impõe com seu gesto de simplicidade.

Era apenas um pedido que você ignorou.
Um sentimento sincero que você rejeitou.
Uma súplica, um pedido de ajuda.
Sua mão recolhida me negou acolhida.

Era apenas um pedido, um pedido e nada mais.
Sua escolha me condenou a solidão atroz
Era apenas um desejo externalizado em palavras
Frustrado pelo teu medo acabou acorrentado.


quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Coroa de flores

Os mais simples ornamento é complemento para tua beleza.
Várias cores flores em coroa sobre tua cabeça.
Um enfeite digno da sua realeza.
Suave como um sorriso verdadeiro portento da real beleza.

O mais simples acessório enfeita tua cabeça.
Te conecta com a realidade e te dá graça com natureza.
Torna-te divina com a guirlanda colorida.
Mais bela das mortais coroada como uma ninfa.

Uma simples coroa de flores vale mais que mil coroas douradas.
Pois o ouro não reflete a beleza das florestas.
Nem tampouco manifestaria o encanto que em ti encontro.
Mas uma simples coroa de flores é o mais belo dos arranjos.

Laços finos e delicados como tuas mãos
Vigorosos e resistentes como o teu coração.
Colorida como o teu sorriso e brilhante como teu olhar.
Tu e a coroa sois um, difícil de separar.

Coroada como com flores, coroada como o sol.
Teu sorriso brilha e ilumina os caminhos como um farol.
Ornamentada de natureza e encanto particular
Enfeitada para agir e não para adornar
Coroada pelas flores és tu como uma delas.
Encanta quem te perscruta a alma
Vê em ti bosques profundos florestas densas
Um mistério que se revela a quem em ti navega

Sem medo do que a coroa de flores verdadeiramente encerra.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Silêncio XI

Esse silêncio que nos separa
Forma um mar de palavras
Palavras profundas
Palavras vazias.

Esse silêncio que nos rodeia
É o vazio que nos medeia
Palavras não ditas por covardia.
Palavras desejadas, mas não proferidas.

Esse silêncio que nos divide
Um abismo de letras soltas
Palavras pensadas, mas esquecidas
Palavra construídas, mas ignoradas.

Esse silêncio surdo
Esse vazio do não dito.
É tagarelice inaudível
É conversa performática
É silêncio em plenos pulmões.



segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Amazona

Olhar resoluto e voz suave
Mulher vigorosa e de muita coragem.
Simples com as palavras e de virtudes mil.
Guerreira corajosa mulher mais bela que já se viu.

Beleza de todos os tipos e de riqueza sem igual.
Inteligência sem desatino e prudência fenomenal.
De coração terno se interessa por palavras
Ama o saber, ama o bem, ama o justo.
Beleza de todos os tipos e riqueza excepcional.
Olhos determinados, voz segura, desejo orientado.

A maior riqueza ouro nenhum pode comprar
Bom caráter e justiça, honestidade e franqueza
Humildade e a verdadeira beleza.
Mas riqueza dessa guerreira é verdadeira
É sensibilidade que vem da alma.
É coragem que impulsiona o coração.
É a inteligência que eu respeito e sequestrou meu coração.


quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Silêncio X

Um silêncio feito de saudade
Feito de recordações e verdades.
Um silêncio mítico
Fabricado de palavras e delírios.
Um silêncio observador
É sempre complacente com a minha dor.
Um silêncio tagarela
Diz muito em sua mudez com a sua fala profética.
Um silêncio inteligente
Que atiça o coração da gente.
Um silêncio engodo
É ardil para os tolos.
Um silêncio despretensioso
Esse silêncio só toca o coração de homens corajosos.
Silêncio agradável
Me lembra o quanto és desejável.
Silêncio conciliador
Meu silêncio é prova do meu amor.


Brener Alexandre 23/09/2015

sábado, 22 de agosto de 2015

Lado escuro da lua

Só ontem me dei conta de que só viam o lado escuro da lua.
O lado escuro da alma, lado oculto do espírito.
Só ontem me dei conta da escuridão escondida
Da penumbra que existia.

Um lado escuro que nem eu mesmo via, embora soubesse que existia.
Um lado oculto que todos veem, embora escondido, ofuscado, embora em segredo, manifestado.
Só ontem percebi o lado oculto esburacado, ferido e chagado.
Escuro e frio nunca iluminado e sempre escondido é o lado obscuro apercebido.

Só ontem percebi o lado escuro da lua,
O lado escuro do espírito, lado escondido da alma.
Só ontem tomei nota da escuridão que me aturdia
Da penumbra que existia.

Um lado escuro que eu via, porém fingia que não existia.
Um lado oculto que assusta e todos veem, manifestado como um eclipse.
Uma penumbra que ofusca o brilho refletido.
Uma sombra projetada pelo destino.

Só ontem me dei conta do que vi, o lado oculto da lua.
O lado escuro da alma, lado obscuro do espírito.
Só ontem notei a escuridão velada
As feridas provocadas engolidas pelo breu.
A penumbra que cobre o lado oculto,
A escuridão que gela a alma,
Obscuro caminho de dor,
Segredos da alma que sofre,
Lado nunca iluminado,
Sempre escondido da luz,
De costas é açoitado
Pelas dores soturnas da alma,
Pela falta da luz do coração.


terça-feira, 18 de agosto de 2015

Só sorrio para ti.

Só sorrio para ti, um sorriso em segredo.
Espontâneo e sincero sorrio sempre que lhe vejo.
Pessoalmente, ou na mente, em fotografias e arremedos.

Só sorrio para ti, entre tantos rostos conhecidos.
Natural e franco é a oferta do meu sorriso.
Quantas vezes lhe vejo, quantas vezes sorrio.
Um sorriso sincero, terno e alegre como um riso.

Só sorrio para ti, pois é só a ti que os meus olhos veem.
O meu coração só reconhece a ti e mais ninguém.
Cada vez que a tua imagem aparece para mim.
Meu coração se alegra sorrindo para ti.
Um sorriso é um cartão de boas vindas.
Um convite aberto para você fazer parte da minha vida.

Só sorrio para ti, e meus olhos procuram por ti.
Nos vazios e nas ausências, na memória e nas essências.
O sorriso meio alegre e meio triste é verdade.
Alegre porque te ama e triste porque tem saudade.




sábado, 15 de agosto de 2015

Diógenes e a Lanterna ou procuro um político honesto

Há uma anedota famosa transmitida por Diógenes Laértio na sua Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres acerca de Diógenes, o cão ele nos conta que: “durante o dia, Diógenes, caminhava (periéei) segurando uma lanterna dizendo: ‘procuro um homem’! (anthropon zetô)” (Diógenes Laértios,Vidas e Doutrinas. VI,II,41).
Essa anedota chama a atenção pelo excentrismo do filósofo cínico, mas a sua performance nos diz mais do que queremos saber. Na linha acima desse relato Laértio no informa que: “Diógenes dizia que os demagogos são empregados das massas (ókhlou diakónous)” (Idem. VI,II,41). Imaginem Diógenes, ele toma a sua lanterna em plena luz do dia e perambula pelas ruas da cidade gritando: “procuro um homem de verdade” digo perambula, porque é exatamente isso que o verbo pérao  indica, quer dizer, Diógenes andava de um lado para o outro com sua lanterna em punho.  Procurava um homem de verdade, ánthropos, o gênero humano por excelência e não o homem e a mulher, o macho e a fêmea, mas a humanidade escondida por detrás do macho e da fêmea, do homem e da mulher. Mas hoje quero repetir o gesto do filósofo cínico e pegar a minha lanterna, porém, não vou procurar por um homem de verdade, mas por um político honesto.

Procuro um político honesto, porque só me deparo com demagogos. Me sinto como Diógenes que sempre que lhe perguntavam se havia muita gente em um lugar respondia: “sim, muita gente (ókhlos polýs), porém, poucos homens (olígoi d’ hoi ánthropoi)” (Cf. Idem. VI,II,60). Chama a atenção pelo contraste entre ókhlos e ánthropos, entre multidão, massa, turba de um lado e homens do outro. Para o nosso filósofo cínico a práxis política se resume a demagogia, e creio que seu diagnóstico se dá principalmente pela força dos discursos que ouvira na assembleia ateniense. A política resumida à demagogia, isto é, a condução do povo, dessa multidão que corre como um rio impetuoso. Por isso também Diógenes louvava quem queria participar da política (assumindo um cargo), mas não assumia. Diógenes, é certo, seria considerado um anarquista e o anarquismo pela sua radicalidade pode ser difícil de ser compreendido e assimilado, mas ao menos nos põe a pensar, e a querer perambular com uma lanterna na mão a procurar um político honesto, um homem de verdade.

Procuro um político honesto, mas só me deparo com demagogos. Procuro um parresiásta, mas ele se esconde da política. A política como profissão exige de quem a professa que seja capaz de vender a mentira como verdade. O político profissional é um adulador que diz o que a turba quer ouvir, por isso “o demagogo é um empregado das massas”, porque se põem aos seus serviços adulando-o. A adulação passa do dizer o que a multidão quer ouvir a fazer o que ela deseja, mesmo que isso seja prejudicial.

Inquerido, certa vez, sobre que fera teria a mordida pior, Diógenes respondeu que das feras selvagens o sicofanta (os sicofantas viviam da extorsão e do estelionato) e das feras domésticas o adulador (kólacs) (Cf. Ibidem. VI,II,51).
Ser seduzido pelo adulador, seja no âmbito privado, isto é, pelos amigos e familiares que querem receber seus favores, seja no âmbito público, ou seja, pelo demagogo é receber uma mordida terrível.

Vou segurar a minha lanterna, sob o brilho da luz do sol em busca de um político honesto, em busca também da minha honestidade, e gostaria de ter a felicidade de encontrar ao menos uma das duas coisas.

terça-feira, 4 de agosto de 2015

Antes me viesse a morte- irmã morte

Pois, antes me viesse a morte e de surpresa me levasse, de súbito a noite enquanto durmo, e não mais eu acordasse.
Pois, antes me viesse a morte, irmã querida de Francisco pela mão me puxasse e trouxesse contigo um sorriso amigo.

Antes a morte sincera e destemida, do que essa vida ingrata e cheia de mentiras.
Antes a morte, irmã doce e gentil, do que a vida amarga, inimiga vil.

Pois, antes me viesse a morte, sono profundo e misterioso,  me tomasse devagar sem dor e sem pressa como a alegria de caminhar numa praça de bicicleta.
Pois, antes me viesse a morte, irmã querida de Antônio, de súbito me abraçasse de felicidade e em pranto.

Antes a morte que torna todos iguais, do que a vida injusta com suas desigualdades triviais.
Antes a morte, irmã suave de outrora, do que a vida insossa que me persegue toda hora.

Morte, irmã morte, vem como sono tranquilo e traz-me de presente o sonho do paraíso.
Morte, irmã morte, vem suave e devagar e me beija com ternura e deixa me se enamorar.
Morte, irmã morte, inesperada e imprevisível vem de surpresa, venha como um desatino.


sábado, 25 de julho de 2015

A Lição de Heródoto: A tirania como constituição da injustiça

No quinto livro de suas Histórias, Heródoto, relata a tentativa de restituir a tirania na cidade de Atenas, e deste modo, suprimir a isonomia recém implantada com a derrocada do filho de Pisístrato, Hípias. Os espartanos querendo suprimir a força que a isonomia deu aos atenienses reúne seus aliados e lhes propõe restituir a tirania conferindo poder novamente a Hípias, porém, Sócles de Corinto nos apresenta o que realmente é a tirania como forma de governo, isto é, como constituição. Para este coríntio a tirania é um mal que deve ser evitado de modo que um governo entre os iguais (isokratia) possa prevalecer como melhor regime político. Vejamos o discurso de Sócles e, então, compreender o que é a tirania e em que medida ela é a constituição da injustiça.

“Sócles de Corinto disse o seguinte: Em verdade, o céu vai ficar por baixo da terra e a terra vai parar por cima do céu, os homens vão morar no mar e os peixes morarão onde antes havia homens, pois vós, lacedemônios, destruindo a isocracia, estais em preparativos para restabelecer nas cidades a tirania, de todas as instituições existentes entre os homens a mais injusta e sanguinária. Se achais realmente um bem para as cidades a submissão a tiranos, começai por instalar um deles entre vós mesmos, antes de tentar instalá-los entre outros povos; agora, porém quereis introduzir tiranos erradamente entre vossos aliados, sem tê-los conhecido por experiência própria, enquanto exerceis a vigilância mais estrita para evitar a sua instalação em Esparta; se tivésseis experiência deles, como nós, poderíeis trazer-nos opiniões mais sábias que as presentes sobre o assunto.” (HERÓDOTO, História V,92).

A afirmação de Sócles começa por constatar que os espartanos desejavam para os outros algo que não desejavam para si próprios, isto é, a limitação do poder político traduzido como liberdade e exercício pleno da cidadania, no entanto, essa liberdade e cidadania não é uma liberalidade, pois a isocracia pressupõe uma constituição que equalize a desigualdade sem que constituição seja destruída. A legislação isocrática reconhece na instituição de deveres e direitos uma igualdade que fortalece as relações do cidadão com a sua comunidade política. Aquilo que os gregos chamavam de democracia, e os latinos de república é uma constituição isocrática por excelência na medida em que a legislação se colocava como mecanismo regulador do poder político, ou na medida em que a lei dá ordenamento e, portanto, regulamenta a forma de fazer política impedindo que indivíduos ou grupos políticos usassem do poder para constranger e reprimir os demais cidadãos. Com efeito, os espartanos desejavam não para si, mas para os seus inimigos a tirania, pois esta cerceava a liberdade dos cidadãos por meio de coerção violenta e desse modo impedia o crescimento e desenvolvimento daquela comunidade política subjugada pelo tirano. Por outro lado, a fala de Sócles revela que a tirania se fosse boa seria desejada pelos espartanos como regime político ideal, mas na verdade os espartanos eram extremamente rigorosos para minar qualquer possibilidade de se levantar um tirano entre eles. Isso nos mostra que a tirania só é benéfica para quem usufrui do poder que ela concede, em outras palavras, a tirania faz jus ao ditado popular: “pimenta nos olhos dos outros é colírio”. A tirania é nesse sentido um regime totalitário, em que poder é exercido com violência por um ou mais cidadãos deformando a constituição vigente retirando direitos e imprimindo deveres que ferem o princípio isocrático  outrora presente na constituição. Sócles continua seu discurso falando de Cípselos e seu filho, ambos tiranos que governaram Corinto com mãos de ferro vejamos um pouco mais de seu discurso aos espartanos.

“Depois de Cípselos ter-se tornado tirano transformou-se no seguinte tipo de homem: ele baniu muitos coríntios, despojou muitos de seus bens e tirou a vida de um número ainda maior. Após reinar durante trinta anos e levar uma existência entremeada até o fim de dias felizes, Cípselos foi sucedido por seu filho Períandros. Inicialmente, Períandros foi mais brando que seu pai, mas após travar relações através de mensageiros com Trasíbulos, tirano de Mileto, passou a ser ainda mais cruel que Cípselos. Ele (Períandros) tinha mandado um arauto a Trasíbulos, com a missão de saber do mesmo a maneira mais segura de pôr em ordem todos os assuntos da cidade e melhor governá-la. Trasíbulos levou o arauto de Períandros para fora da cidade e entrou em sua companhia num campo cultivado; percorrendo um trigal, ele  interrogava repetidamente o arauto a respeito de sua vinda de Corinto, e ao mesmo tempo cortava todas as espigas que aos seus olhos pareciam ultrapassar as outras em altura;uma vez cortadas essas espigas, Trasíbulos jogava-as no chão, até que, agindo dessa maneira, havia destruído as espigas mais belas e mais carregadas de grãos entre todas as existentes na seara. Percorrido o campo, e sem dar uma palavra sequer de conselho, Trasíbulos mandou o arauto embora. Quando este regressou a Corinto Períandros procurou ansiosamente saber qual tinha sido o conselho tão esperado. O arauto apenas respondeu que Trasíbulo não lhe havia dado conselho algum; ele manifestou estranheza pelo fato de Períandros tê-lo mandado procurar um homem como aquele, desequilibrado e destruidor de suas próprias coisas, e em seguida relatou o que vira Trasíbulos fazer. Períandros compreendeu o sentido desse procedimento, e percebeu que o conselho de Trasíbulos era mandar matar os cidadãos que sobressaíssem entre os outros; e desde então ele mostrou toda espécie de malignidade em relação aos coríntios. Tudo que Cípselos havia deixado inacabado em matéria de assassínio e banimento Períandros terminou. (...) Isso é a tirania, lacedemônios, e assim ela age. (...) Conjuramo-vos, em nome dos deuses dos helenos, a não instituir tiranos nas cidades. Não desistireis de vossos desígnios e ireis insistir, contra a justiça, em trazer Hípias de volta? Ficai sabendo, então, que ao menos os coríntios não concordam convosco.” (HERÓDOTO, Histórias V,92).

Nesse longo relato de Sócles de Corinto podemos ver a natureza da tirania e porque a sua instituição fere a justiça e a isocracia. O tirano exerce o seu poder como império, isto é com força excessiva, com violência. Para assegurar o seu poder ele retira o poder dos demais, não tolera aqueles que se sobressaem e que, portanto, podem se destacar dos demais. Desse modo, cria dispositivos para suprimir os direitos e impondo o dever de obedecer sob coação, por meio de pilhagem na forma ou não de impostos abusivos e desapropriação de bens. A igualdade é sempre colocada para outros de modo que o tirano esteja sempre acima dos demais e acima da constituição que deve sempre lhe beneficiar. O tirano é, em suma, desequilibrado pela sede de poder e por não ter a lei como régua e como limite para o exercício do poder.

Toda forma de ditadura é tirania, porque vê a constituição como um simples acessório e não como a carta magna que regula a vida da comunidade política. Usa-a para atingir o poder, mas limita ou modifica a mesma constituição para se perpetuar no poder. Além, de desejar controlar todas as forças institucionais do Estado para si e, assim ter o controle sobre tudo e sobre todos, dizer o que é o certo e o que errado eliminando toda possibilidade de diálogo, abrindo brecha para a corrupção ao agregar um poder absoluto.

E, se, portanto, a justiça é conferir a cada um o que é seu, a isocracia seria em termos de constituição a forma mais justa e a tirania o seu oposto, pois impede por meio da violência que cada um desenvolva seus talentos naturais, isto é, se sobressair de forma justa amparado pela constituição e a legislação que regula na forma da lei qual é o critério que torna justo ou injusto o crescimento de alguém. A igualdade perante a lei equaliza por meio da lei o que é naturalmente desigual. Conferindo direitos e deveres iguais a todos conscientizando cada cidadão da sua responsabilidade por fazer da sua comunidade política uma comunidade mais justa e menos violenta.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Biruta

A biruta vai aonde o vento assopra
Para todos os lados, ela vai e volta.
A biruta segue sempre o caminho das ventanias.
Sul ao norte, do Oeste ao leste, do Norte ao sul e do Leste ao oeste.
A biruta se move por paixão seduzida pelo vento vai a qualquer direção.
A biruta ficou biruta girando para todos os lados.
Afetada pelo vento era afetada pela vontade
Inclinada pelo desejo não encontrava a verdade
Perdida se inclina em qualquer direção
Ao sabor do vento se encaminha para a desrazão.
Persuasão que me seduz ao sabor de uma opinião
Me inclino ao que me agrada dou meu assentimento e razão.
Opiniões são como o vento e vem de todas as direções
A biruta pobre coitada não tem opinião sobre nada
É cabeça de vento nata, tal é a sua condição.
Boca aberta e cabeça vazia
Entra e sai de idéias
Inclina-se a cada ventania
Como a mente insensata a qualquer idéia.
Biruta de cabeça vazia
Biruta ensandecida
Maluca, doidinha
Quando vem a ventania
Gira para todos lados nossa amiga birutinha

Tentando seguir o rastro da insensatez dos pontos de vista.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Atlas

Que peso é esse sobre os meus ombros?
Que fardo é esse sobre as minhas costas?
É o peso do ar inspirado
É a supressão de um coração que suspira.

Um titã carregando o mundo nas costas
Um titã carregando a própria vida.
Um titã suportando a própria existência
Esmagado pelo peso de si todos os dias

Que peso é esse que me sobrecarrega?
Que peso é esse que não é responsabilidade minha?
Peso criado para ser castigo
Peso que paralisa a minha alma sofrida.

Suporta o peso dos céus, pois este é teu suplício.
Aguenta a Terra sobre tuas costas é a tua condenação,
Encara sem medo a tua existência e finda carregando este peso em vão.

terça-feira, 12 de maio de 2015

Ben Hur e a experiência do encontro com o Senhor

Esse final de semana tive a oportunidade de assistir a um remake do clássico Ben Hur. Aos que gostam de filmes épicos como é o meu caso é sempre um deleite e não percebi exageros como normalmente acontece nesse gênero de filmografia.  Mas gostaria de partilhar com os meus leitores algo que me chamou muito a atenção no filme. Ben Hur é uma mistura de Conde de Monte Cristo com Crime e Castigo, explico!

Ben Hur ou Judas Ben Hur era um judeu rico de Jerusalém e cresceu com um jovem filho ilegítimo de um senador romano de quem se separa ainda na infância. O jovem retorna a Jerusalém agora como um soldado e tem a missão de escoltar o novo governador da judéia, Pôncio Pilatos. Quem conhece um pouco da história sabe que a ocupação romana não era bem vista em nenhuma das províncias, principalmente porque a pax romana era uma imposição violenta. Em Israel não era muito diferente principalmente pelo conflito de culturas presente no contraste entre o politeísmo romano e o monoteísmo judaico. Naquela época havia vários grupos entre os judeus que viviam e assimilavam a fé de formas diferentes, só depois da destruição do templo em 77d.C. é que o judaísmo de organizou com o grupo sobrevivente, os fariseus.  Dentre esses grupos havia um em especial que causava muitos problemas aos romanos trata-se dos Zelotes que se revoltavam constantemente contra os romanos provocando muitas mortes nos conflitos contra seus conquistadores.

Judas Ben Hur era um comerciante justo e honesto e, quando seu amigo volta para Jerusalém, o jovem Messala, educado a moda romana quer que tudo saia bem porque seu pai o Senador Marcellus Agripa quer por meio de uma manobra política ele assuma o governo da província da Judéia no lugar de Pilatos. E para que tudo dê certo Messala espera de Judas que este lhe conte sobre qualquer invectiva contra os romanos quando da passagem do governador. Ben Hur sabia que havia pessoas que queriam se aproveitar desse evento para promover uma revolta, mas prefere não entrega-los, pois isso seria uma forma de alta traição, mas também não quer se envolver com a revolta por ter boas relações com os romanos e principalmente por ser muito amigo de um romano. Acontece que por conta de uma telha solta Judas é acusado de “dar um sinal para os rebeldes” e é preso junto com toda a sua família e isso inclui a sua noiva e o pai dela. O destino parece selado, Pilatos quer crucifica-lo e matar sua mãe e sua irmã, mas a pena dele é mudada e ele é condenado à escravidão perpétua. Tudo o que Ben Hur deseja é vingança contra seu antigo amigo. Quando Judas está saindo da cidade santa para o seu terrível destino um homem o interpela dizendo: “perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem...” Esse homem era Jesus, o nazareno e este foi o primeiro encontro de Judas com o galileu. 

Depois de uma grande reviravolta Judas é adotado por um romano que lhe dá o seu sobrenome e tudo o que lhe pertence, Judas está disposto a usar todos os recursos para se vingar de Messala e parte novamente para Jerusalém. Ben Hur não sabe que sua noiva e o pai, sua mãe e irmãs estão vivas. No caminho para Jerusalém Judas escuta uma pregação e a ouve por alguns minutos antes de seguir viagem, sua noiva estava lá, mas não o viu, o pregador era Jesus, o profeta da Galileia e o conteúdo de sua pregação é o sermão da Montanha. Judas entra em Jerusalém e readquiri sua casa que estava abandonada sob custódia do governo romano e usando seu nome romano arquiteta sua vingança nesse meio tempo reencontra sua noiva que tenta dissuadi-lo da vingança e exortando-o a perdoar, mas Judas Ben Hur só conhece a lei do “olho por olho” ignorando a lei do perdão. Executa a sua vingança sem saber que suas irmãs estão vivas, e tendo terminado sua vingança vai ao encontro delas, pois estavam doentes, com lepra e só podiam permanecer fora da cidade ou quando muito teriam de gritar “impuro” para afastar as pessoas quando pedia esmola. Quando entra em Jerusalém, um homem condenado à morte de cruz está saindo da cidade ele cai e é duramente açoitado pelos soldados, sua noiva a jovem Esther reconhece o homem caído, mas tomada de tristeza e consternação não diz nada apenas chora e lamenta pelo homem condenado. Judas, por outro lado, ao ver a atitude dos soldados se interpõe contra eles para ajudar o homem, os soldados recuam, Judas estende a mão ao homem caído que lhe diz: “perdoa-lhes porque não sabem o que fazem...” Nesse momento, Judas fica paralisado, mudo e se recorda de ter ouvido anos antes a mesma frase, nesse momento Judas parece se dar conta de estar diante de um verdadeiro profeta de um homem justo. As palavras de Jesus penetram fundo a alma desse homem amargurado pelo desejo de vingança e finalmente liberto do rancor perdoa o amigo que morre.

Libertado, liberta também a outros, Jesus, profeta, justo, santo, ungido é pregado na Cruz e morre, as trevas cobrem a cidade santa, mas a luz não deixa a casa de Ben Hur e sua mãe e sua irmã são curadas da lepra e purificadas pelo perdão.

Assim como Raskolnikov em Crime e Castigo é gradativamente libertado pela doçura e amor de Sônia. Ben Hur é transformado pelo amor de Esther, sua noiva, e pelas palavras de Atene uma prostituta grega que exerce o papel de espiã do senador Marcellus Agripa. Duas mulheres que se portam cada uma a seu modo como “vozes da razão” poderia ser o prelúdio do encontro de duas tradições, Esther seria a personificação da cultura hebraica e Atene a personificação da cultura grega.  E a experiência do encontro com o profeta galileu é o mediador das duas tradições em aparente conflito, mas que caminham lado a lado em busca da justiça e do bom senso. São as palavras de Jesus que acenam para Ben Hur aquilo que as duas tradições por si só não foram capazes de lhe revelar completando o sentido que as duas tradições manifestam cada uma a sua maneira.  A vingança um direito consentido nas duas tradições provoca vazio e diminui a humanidade, e o perdão supera a justiça da retaliação dando novo sentido que extrapola toda forma de marginalidade e de poder que nossa parca humanidade alimenta.


Três encontros e sempre o perdão pelos que não sabem o que fazem. A justiça supera a vingança e a verdade é galgada pelo amor, verdadeira liberdade para o homem.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Amizade Virtual

Amor solitário, amor à distância.
Amizade virtual é amor surreal.
Amizade virtual é amizade de cristal.
Tudo é visto, tudo é ignorado,
Tudo é dito no silêncio incontornável.

Amizade virtual, artificial.
Amizade virtual, descompromisso sem igual.
Amizade virtual, um pacote à la carte.
Amizade virtual, sem decepção e combate.
Tudo é escolhido, até quando finjo não escolher.
Tudo é medido, porque não quero me comprometer.

Amizade virtual que cabe em caixinhas reluzentes.
Amizade virtual forma de amor decadente.
Amizade virtual com o vizinho que mora em frente.
Amizade de mentira que facilita a vida da gente.
A dor do outro não importa.
A tensão me desespera.
Vontades em conflito .
É agonia e angustia certa.

Amizade virtual cabe na palma da mão.
Cabe na pupila contraída que não quer ver decepção.
Amizade virtual de janelas que não revelam o mundo.
De ideias fabricadas, vontades obliteradas, paixões fingidas.
Carinhos dissimulados.
Vida real maldita, ingrata e dolorida.
Prefiro essa vida vazia cheia de mentiras
Que a dor e a agonia de ver gente real.
Que desafia e me instiga
Que me alimenta e ilumina.

Amizade virtual é como amigo imaginário.
Crio um que não me dá trabalho.
Amizade virtual não toca de verdade.
Sua artificialidade esconde as almas covardes.
Tudo é mediado e o amigo está tão longe
Mesmo quando está ao lado parece estar do outro lado de uma ponte.
Amizade virtual é coisa que você põe na sua cabeça
Por medo de se machucar, te tornas incapaz de descobrir a beleza:
Que há na alma dos outros,
Que há na tensão do encontro,
Que há no amor construído,
Que há na descoberta do rosto do outro.


Brener Alexandre 11/05/2015

domingo, 10 de maio de 2015

Mãe

“Se não fossem as mães, que saberíamos do amor?” (Comte-Sponville, André. Apresentação da Filosofia. p. 44).

Talvez a resposta à pergunta do filósofo seja: Se não houvesse mãe saberíamos pouco ou quase nada sobre o amor. Mãe é sinônimo de amor, é sinônimo de cuidado e carinho.
Mãe é antônimo de abandono é substantivo simples, fácil de apreender o sentido, é substantivo composto porque toda mãe pede complemento, não há mãe sem filho, não há filho sem mãe.
É verbo, advérbio e adjetivo, tantas classes de palavras unidas em um único vocábulo: mãe, mamãe, mãezinha, manhinha.

Se não fossem as mães uma parte da nossa humanidade se perderia, uma parte divina por certo, Deus quando desejoso de viver entre nós quis ter uma mãe e tão generoso a entregou a nós: “mulher eis aí teu filho, filho eis aí tua mãe” (Jo 19,26).

Ser mãe é algo que compreendo bem pouco, primeiro porque jamais serei mãe, no máximo imitaria uma mãe. Ser mãe é coisa complexa, é biológico, psicológico e ético.

Ser mãe não é simplesmente assumir um papel social, é muito mais que isso é ser encarnação do amor. A pergunta do filósofo Sponville pode ser traduzida assim: Deus é amor como é muito bem dito por São João, mas a mãe também é amor assim como Deus. Mãe é amor como Deus é amor, é um amor infinito dentro da finitude de uma existência. Se não houvesse a maternidade seria humanamente impossível conhecer um amor como amor divino.

Ser mãe é, portanto, ser dádiva. Ser presente e presença, ser dom.
Mãe é aquela que cria? Mãe é aquela que gera? Não, Mãe é aquela que ama.

Feliz dia das mães para minha mãe e para a sua também.

Brener Alexandre 10/05/2015


terça-feira, 28 de abril de 2015

Olhos Culpados

Olhos culpados pelo amor que possui
Olhos culpados pelo amor que deseja dar
Olhos culpados...
Culpa por amar

Olhos que sabem quando o amor é transgressão
Quando a vontade suplanta a razão
Quando o querer massacra e castiga,
Quando amar não basta
E o amor é prisão pior que a bastilha.

Olhos culpados em rosto inocente
Olhos culpados em alma temente
Olhos culpados acusados pelo destino
Rosto insone, corpo destruído.

Olhos culpados por um crime surreal
Acusado de amar, acusado de não querer mal.
Olhos culpados felicidade reduzida
Solidão imposta que não edifica.

Olhos culpados poeta maldito
Olhos culpados lhe falta amigos
Olhos culpados marca de Caim
Olhos culpados tristeza sem fim.


domingo, 26 de abril de 2015

Elegia do solitário errante



Veja meus olhos, olhe a minha solidão
veja meus olhos e veja a dor no meu coração
Sinta melodia que corta a minha alma
Sinta a minha dor e as minhas lágrimas que me cortam.
Ouça as minhas lágrimas elas gemem por mim.
Ouça a escuridão que habita dentro de mim.
Não há misericórdia para o homem solitário.
Homem apartado e cujo destino trágico,
é ser elo quebrado,
ovelha desgarrada,
coração partido,
alma desfigurada.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Silêncio IX

O silêncio sempre tem algo a me dizer
Sempre tem um porquê
O silêncio nunca é por acaso
Olhos atentos ou olhos desviados
O silêncio teu me corta
Como a lâmina cega de uma espada
O teu silêncio me agride
Me insulta
Teu silêncio me machuca
Me ofende
Finge que não me vê
Ou não quer nem saber
Olhos silenciosos
Corpo mudo
Boca fechada

Como o céu do meu triste mundo.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Fala do Coração

Deixa o meu coração te falar
Deixa o meu coração te dizer
Deixar o meu coração sussurrar que ele ama você.

Meu coração fala por meio de versos e de prosa
Fala por meio do abraço e do beijo que aquece a alma.
Meu coração fala, diz muitas coisas em segredo
Meu coração sussurra o amor que guarda por medo.

Deixa o meu coração te falar
Escuta a fala do coração
Suas razões não se explicam com lógica
Suas razões se explicam com emoções.

Deixa o meu coração te falar
Deixa o meu coração te querer
Ele se preocupa contigo e não quer te ver sofrer

A fala do coração é alimento para alma
Palavras de destino incerto como as ondas sonoras
Deixa o meu coração sussurrar o amor que tem por você
Deixe-se se tocar com o que o meu coração vai dizer.
O meu coração está sussurrando nesse momento
Ele está te admirando
Fazendo versos sobre sua nobreza
Fazendo prosa da tua grandeza.

Deixa o meu coração falar
Escute a sua voz sem temor
O amor em segredo que vela por ti
Com respeito e pudor.

Deixa o meu coração te cuidar
Não tenha medo do meu coração
Amizade que te quer bem
Amor que não é só sedução.
Conquista definitiva
É o que fala o meu coração
Quando todas as coisas bonitas
Quando perscruta o seu coração.


domingo, 22 de março de 2015

Democracia lugar do lógos do contraditório e dos contrários

Tucídides escreveu no início de sua História da Guerra do Peloponeso que: “quem quer que deseje ter uma idéia clara tanto dos eventos ocorridos quanto daqueles que algum dia voltarão a ocorrer em circunstâncias idênticas ou semelhantes em conseqüência de seu conteúdo humano, julgará a minha história útil e isso bastará. Na verdade ela foi feita para ser um patrimônio sempre útil, e não uma composição a ser ouvida no momento da competição por algum prêmio.” (Tucídides, História da Guerra do Peloponeso I,22).

Tucídides nos ensina que o trabalho memorial da história se preza a nos ajudar a compreender o fenômeno humano, tanto dos que já aconteceram, quanto dos que podem voltar a se manifestar. Nesse sentido a história é um saber dinâmico que sempre se volta para o passado para compreender o presente e evitar um futuro desastroso para todos.
Por isso ao invés de simplesmente recorrer à filosofia enquanto saber perene que nos convida à krísis, vale dizer, nos convida à reflexão crítica da realidade me senti na necessidade de recorrer à história para que aprendendo com ela possa fazer filosofia da história e na história e não apenas história da filosofia.

 Ao invés de procurar os fatos da história recente vou dialogar com um homem muito mais velho que o nosso país para falar do nosso atual momento político. Como foram os gregos que nos legaram um modo peculiar de fazer política e com isso me refiro à democracia, pois, de fato, os mais adequados para nos ensinar o caminho para compreender que toda a forma de despotismo e tirania nos conduz a um estado inferior ou de subserviência que contraria qualquer regime que se pretende democrático são os antigos gregos.

A democracia é o regime político da contradição e do contraditório e só é possível pelo exercício da palavra, do direito à palavra. E, enquanto lugar privilegiado do exercício da fala e do embate pela palavra precisa ser por meio do amparo da lei, com liberdade e verdade para se consolidar como governo do povo e para o povo. Por isso a análise feita por Foucault (quem tiver o interesse de ler mais sobre o assunto temos as traduções da Martins Fontes das obras de Foucault: Hermenêutica do sujeito, Governo de si e governo dos outros e A coragem da verdade) da parresía é de suma importância para a compreensão da democracia como forma de governo em que o poder é exercido pelo uso da palavra. Foucault nos ensina analisando a tragédia Íon que a parresía se manifesta primeiro como isegoria, isto é, como direito igual à palavra perante a lei. Depois a parresía vai significar mais que ter o direito à palavra na àgora (isso é o que significa isegoria literalmente), mas significará dizer o que pensa (nesse sentido a parresía já começa a ser associada a franqueza, sinceridade) e se nos voltarmos para alguns relatos de discussões feitos por Tucídides em sua História da Guerra do Peloponeso perceberemos uma identificação da parresía enquanto o exercício livre da fala e da liberdade de se exprimir como a doxa, vale dizer, com a opinião.

O pensar aqui não é o criterioso pensar filosófico, mas é o pensar no sentido de o que está na cabeça do falante, por isso equivale a opinião, posto que a opinião exprime uma convicção do falante. Quando olhamos para essas duas acepções da parresía percebemos como a fala é mecanismo para a manutenção do poder na democracia antiga (que como todos sabem é participativa e não representativa). Será com a filosofia que a parresía estará associada com o falar a verdade, mais do que ter direito à palavra e exprimir sua opinião, mais do que poder dizer o que pensa o parresíasta agora é aquele que diz a verdade e a diz com franqueza, fala abertamente a todos (no cristianismo a parresía também carrega todos esses traços delineados até aqui. Por exemplo em Jo 11,14 o evangelista escreve: “Tóte oun eipen autois ho Iesous parresía” e ‘Então Jesus lhes disse abertamente’). Quando a parresía se torna sinônimo de ter coragem para dizer a verdade, daí o titulo de um dos cursos de Foucault: “A coragem da verdade” no lembra como esse conceito está imbricado pela política e particularmente pela democracia. Ora, como eu disse anteriormente uma das características da democracia é o contraditório e as contradições que não estão presentes só nas pessoas, mas no próprio regime democrático. E a vida política na antiguidade é permeada pelo exercício da cidadania principalmente quando a assembléia se reunia na àgora (praça do mercado). A parresía, enquanto, franqueza e verdade se opõe diametralmente a retórica e a bajulação, posto que a verdade é  fim em si mesmo, isto é, é uma revelação que embora possa ser útil a todos pode ser extremamente perigosa para quem a diz. A retórica é o instrumento maior para quem pretende domar a assembléia é a ferramenta que se coloca à serviço da persuasão,  a bajulação também é uma forma de buscar conseguir o que se quer de alguém, pois omitindo a verdade eu digo o que o meu interlocutor deseja ouvir em troca de favores ou benefícios persuadindo-o a fazer o que eu desejo. Era assim que funcionava a vida política dos gregos e depois dos romanos no período republicano. Quem sabia falar e conduzir a assembléia tinha nas mãos o poder para decidir e governar.

Apesar de o modelo democrático ter sofrido algumas alterações deixando de ser uma democracia direta para ser uma democracia semi-direta (como é o caso do Brasil), ou seja, há dispositivos legais para que a população possa participar do governo, mas normalmente delegamos a outras pessoas o trabalho de governar o país através do sufrágio, ou voto. Desse modo escolhemos representantes para dois dos três poderes que se fiscalizam mutuamente garantindo que o país funcione e eventualmente e se for necessário a população pode por meio de referendo, plebiscito ou lei de iniciativa popular decidir questões de interesse da população ou mesmo propor leis para serem votadas no congresso nacional. E de fato, muitas questões poderiam ter a atenção do povo (nossa presidente da República, por exemplo, queria que a reforma política fosse consultada por meio de um plebiscito ou referendo, o que foi vetado pelo congresso). No entanto, o exercício da palavra e o embate discursivo ainda se faz presente no nosso meio de vários modos e em vários seguimentos do nosso dia-a-dia político. As redes sociais, as conversas nos grupos de amigos e colegas de escola, trabalho enfim, onde é possível o diálogo e onde é possível exercer a isegoria esse direito à palavra não poupamos esforços quando inclinados ou interpelados a falar de política expressar nossa aprovação ou reprovação pelo que acontece na República. Heródoto nos conta como os atenienses mudaram seu modo de agir quando libertados da tirania de Písistratos, a democracia nos torna senhores de nós mesmos a liberdade para falar é liberdade para agir. Vejamos o que diz Heródoto sobre essa mudança de conduta do atenienses: “Assim cresceu o poder dos atenienses. Não se evidencia num caso isolado, e sim na maioria dos casos, que o direito à palavra (isegoria) é uma instituição excelente (schema spoudaion); governados por tiranos, os atenienses não eram superiores na guerra a qualquer dos povos seus vizinhos, mas libertos dos tiranos eles assumiram de longe o primeiro lugar. Isso prova que, na servidão, eles se conduziam propositalmente como covardes, pensando que serviam a um senhor (despotés); livres, porém, cada um agia com todas as suas forças para cumprir a missão em seu próprio benefício”.  (Heródoto, História V, 78.)

 O historiador está no mostrando a essência da vida do homem grego como cidadão da pólis democrática de como a descoberta da liberdade por meio do exercício do poder pelo povo e não mais por um tirano muda a motivação dos habitantes de Atenas. Esse poder era visto na antiguidade principalmente nos conflitos com outros povos, era na guerra que essa cidadania se mostrava mais importante, pois proteger a cidade com coragem é proteger a sua liberdade e garantir que a cidade preserve sua integridade (vale lembrar que isso é muito bem explorado por Frank Miller no quadrinho 300 que depois foi adaptado para o cinema). Não obstante o filósofo MacIntyre nos lembra como Péricles transforma a cidade de Atenas em uma figura heróica. De fato, MacIntyre explica que as virtudes homéricas são transpostas para a cidade como um todo encarnando o herói homérico dotado de excelência e nobreza. Ora, a democracia é lugar do contraditório, da polêmica a àgora é a arena em que os cidadãos se enfrentam com o intuito exercer o poder conduzindo os assuntos da cidade e como eu já havia dito a própria democracia é contraditória seja por exercer a tirania (quando deseja dominar outra cidade) seja por acolher ou mesmo rejeitar um determinado modo de pensar. Protágoras, Anaxágoras e Sócrates são testemunhas vitais de como a democracia pode às vezes soar como uma tirania que cala e atua em nome de uma forma “única” e hegemônica de pensar e agir.

O cenário político brasileiro tem nos mostrado um pouco dessa contradição própria da democracia onde o embate principalmente nas redes sociais tem ganhado cada vez mais força e muitas vezes de forma instrumental promovendo desconstruções e ataques a essa ou aquela forma de pensar. Com efeito, assistimos desde as manifestações de junho de 2013 uma mudança no modo de viver do brasileiro que até então praticava a idiotia, vale dizer, não participava de modo mais aguerrido da vida política do país. De fato, as manifestações de junho de 2013 foram o estopim e o pavil foi aceso nas redes sociais, sobretudo, que aproxima eleitores e candidatos, partidos e movimentos sociais de todas as espécies promovendo o embate similiar ao que acontecia na àgora. Depois de uma das eleições mais disputadas para presidência da república presenciamos o descontentamento de muitos brasileiros com os problemas gerados pela forma como o governo tem conduzido o país, além dos escândalos de corrupção que infelizmente minam a força do governo e mostra as fragilidades do nosso presidencialismo de coalização (em que o presidente da república consegue por meio de aliança trabalhar com a maioria do congresso nacional).

Talvez uma das maiores contradições do regime democrático seja a intolerância ao direito à palavra, e isso tem acontecido com relativa freqüência nas redes sociais desqualificando este ou aquele grupo ao invés de efetuar uma refutação com base em argumentos válidos eu simplesmente ataco o interlocutor ofendendo-o de todas as formas possíveis, a democracia que é o lugar privilegiado do lógos (aqui vou manter lógos com o seu sentido polissêmico que abrange desde discurso até razão) também é o lugar da violência e da desrazão (alogia). Esse texto quer em certo sentido chamar a atenção tanto dos descontrutores que são violentos com seus interlocutores agredindo-os com a instrumentalização da informação quanto daqueles que apelam para forças exteriores e intervencionistas como a ditadura militar ou qualquer outra força repressora contra aqueles que não concordam com a opinião expressada por um determinado grupo. Assim como um impeachment também se manifesta quando clamado sem natureza política e jurídica como uma forma de violência contra a democracia exercida pelo poder do sufrágio. Não se trata só de dar voz a maioria ou a minoria, mas de dar voz a todos, pois a característica maior da democracia é a isegoria circunscrita pela isonomia e isso significa que devemos escutar e falar com todos na medida em que somos todos iguais perante a Constituição da República e se os gregos tinham uma lei que exilava todo cidadão que ameaçava a constituição da pólis nós também devemos num apelo de racionalidade sim, em busca do bem comum, ostracizar toda ideologia que deturpa e destrói a nossa Constituição. Eric Weil nos lembra que a racionalidade é uma das formas que o ser humano encontrou para escapar da violência e que a racionalidade demarca o limite entre o moral e o imoral. E se, portanto, desejamos viver em uma democracia sólida é preciso que escapemos da barbárie que violenta a nossa constituição por meio da retórica que coloca o discurso à serviço de ideologias quando a verdadeira retórica, aquela que Platão chamava de filosófica no diálogo Fedro  se empenha em disseminar a verdade para que haja justiça  e justiça para todos. Deixar de lado nossos interesses particulares e garantias que deveríamos ganhar porque o nosso país prospera e não porque apoiamos este ou aquele partido político, essa deveria ser a razão do nosso posicionamento político.

Exercer a empatia quando escutamos o outro e nos livrarmos de nossas contradições internas para que possamos ser o espelho para o país em que vivemos.
E se a corrupção está no nosso gene, então, estamos fadados à ruína. É de um determinismo bárbaro contra o povo brasileiro afirmar que está no código genético dos cidadãos da Terra Brasilis, não creio que isso seja verdade, pois conheci e conheço muita gente honesta dentre pobres e ricos das diversas etnias que compõem o povo brasileiro, acredito sim que há um circulo vicioso no meio político que deturpa e destrói a humanidade dos muitos que ocupam o cargos dos três poderes que exercem o poder em nosso país, corrupção fruto de uma inversão de valores que transforma meios em fins em si mesmo e que coloca o poder a serviço de interesses particulares quando deveria ser posto ao serviço da comunidade chamada Brasil.
O momento atual é fruto não apenas da politização por meio das redes sociais, mas frutos das conquistas que o nosso povo alcançou quando não teve medo de mudar e sempre poderemos mudar quando compreendermos que o poder na democracia emana do povo e que elegemos pessoas que dêem o seu melhor por nós, posto que foi para isso que os escolhemos. Por isso jamais se esqueçam ainda que a se use da mentira para a manutenção do poder não podemos nos esquecer jamais que a “a verdade é irrefutável”.