segunda-feira, 31 de março de 2014

comemorar a ditadura?

   Tenho percebido que quando se trata de política, as pessoas em geral fundamentam seus argumentos no medo, e com isso reagem sempre de modo pouco razoável.

    Li esta manhã uma coisa que me chamou bastante a atenção, uma pequena chamada enquanto esperava para fazer um exame laboratorial, dizendo que em vários lugares as pessoas estão “descomemorando” a ditadura militar que começou em 1964 num 31 de Março como o de hoje, ou seja, a exatos 50 anos.

    Parei para refletir e pensei comigo mesmo, que ao descomemorar as pessoas querem esquecer esse capitulo negro da nossa história. Afinal, de contas comemorar só significa fazer festa para algo ou alguém no sentido mais coloquial do termo, o sentido exato da palavra comemorar é: “trazer a memória junto”, “recordar junto”ou “lembrar junto”. Em outras palavras, comemorar é um ato de não apagar da memória, E não necessariamente fazer festa, geralmente empregamos a palavra comemorar quando acontece algo bom, mas se comemora o que não é bom também, como por exemplo o aniversário de morte de um ente querido, a comemoração não é com festa, mas é com o trazer a memória a imagem daquela pessoa que nos deixou o vazio da saudade.

     Imaginem se os romanos se esquecessem da tirania de Sula? E os atenienses a tirania dos 30?
Não é e não pode ser um olhar para história galgada no partidarismo político, não é a esquerda, ou a direita, mas é a nossa cidadania, somos cidadãos de uma república, de um espaço democrático, no qual reconhecer as mazelas que carregamos a 500 anos de história a fora do qual esses 50 é uma parte recente. Devemos dizer não a toda forma de totalitarismo, pois o totalitarismo é a expressão imperiosa da tirania e da demagogia. Quem argumenta fundamentado no medo, como se um leviatã fosse nos devorar a qualquer momento. Talvez haja mesmo um leviatã, criado por nós mesmos, alimentado pelo nosso medo e que nos faz reagir irracionalmente pedindo ditaduras, afinal de contas ditadura do proletariado, também é uma ditadura, ditadura militar também é ditadura, são formas de poder abusivas em que o direito à cidadania é restringido ao mínimo.

     Como cidadãos devemos nos esforçar para combater essas posturas antidemocráticas, pelo menos na medida em que estamos vivendo em uma república.
Aí reside a importância da História, enquanto ciência humana e enquanto processo da nossa condição de existência, a História é o lugar privilegiado da comemoração, desse ato de trazer à memória os fatos do passado. Tucídides se exprimiu assim sobre a sua História da guerra do Peloponeso

“Quem quer que deseje ter uma ideia clara tanto dos eventos ocorridos quanto daqueles que algum dia voltarão a ocorrer em circunstâncias idênticas ou semelhantes em consequência de seu conteúdo humano, julgará a minha história útil e isto me bastará. Na verdade, ela foi feita para ser um patrimônio sempre útil, e não uma composição a ser ouvida no momento da competição por algum prêmio.” (TUCÍDIDES, História da Guerra do Peloponeso. I,22).

     Portanto, como também disse Platão: “recordar é saber” (citando de memória).
Combatamos o medo com sabedoria e virtude, que o medo não sirva para fundar a nossa reação, mas que ele seja a fonte da nossa busca por conhecimento para que nunca mais o medo seja a base do poder político em nosso país.


Brener Alexandre 31/03/2014