quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Cartas a Lucílio: carta 5: como deve comportar-se o verdadeiro filósofo

Então, pessoal! Estou trazendo hoje uma tradução de uma das cartas do filósofo estoico Sêneca ao seu amigo Lucílio. Infelizmente não fiz uma tradução direto do latim e, portanto, é possível que haja problemas com o texto traduzido. prometo que depois  pego o texto original para corrigir possíveis erros.

A tradução italiana que usei para fazer a minha tradução é da edição Tutti gli scritti organizada por Giovanni Reale a numeração em colchetes segue a numeração que está na edição italiana.

Essa carta é importante particularmente aos que como eu se interessam pela filosofia como modo de vida. Nessa carta Sêneca exorta seu amigo a dedicar-se a vida filosófica e lhe dá os passos para que o faça do melhor modo possível. 
Essa carta é na minha opinião um verdadeiro remédio para alma filosófica, nela descobrimos que ser filósofo está acima de aparentar-se com o filósofo, mas de viver como  filósofo no meio das pessoas sendo-lhes uma referência que chama para a virtude, a justiça e o decoro. 

Esta carta traz consigo informações preciosas sobre a psicagogia estoica (a condução da alma por meio de exercícios espirituais) um verdadeiro tratado de espiritualidade filosófica e um convite à filosofia mostrando que o filósofo pode e deve viver com os demais sendo diferente sem ser extravagante. 

Espero que apreciem a leitura desse clássico da filosofia antiga romana.

Brener Alexandre.

Cartas a Lucílio
Carta 5: Como deve comportar-se o verdadeiro filósofo
[1] Que tu te aplicas com empenho, deixando de lado todo o resto, unicamente para melhorar te todo o dia, eu o aprovo e me satisfaço, e não somente te exorto a perseverar, mas lhe imploro. Te advirto, pois, de não fazer nada de extravagante no que diz respeito ao teu estilo de vida, como aqueles que não desejam progredir, mas fazer-se notar; [2] evite vestir-se com desleixo,  deixar os cabelos longos e a barba se aparo, evite declarar ódio aos talheres e de dormir sobre a terra nua; evite todo procedimento que vise somente chamar atenção. O nome da “Filosofia” já é bastante impopular, mesmo quando praticada com discrição: o que será, pois, se começarmos a nos esquivarmos dos hábitos comuns dos homens? Em nosso íntimo sejamos em tudo diferentes, mas o nosso aspecto exterior esteja de acordo com o das pessoas.
[3] A toga não seja brilhante, mas também não seja imunda, não tentamos possuir talheres cinzelados em ouro maciço, mas sequer consideramos sinal de frugalidade não haver em absoluto ouro ou prata. Comporta-te de modo a levar uma vida melhor que das massas, caso contrário acabamos por pôr em fuga e mantemos afastados de nós aqueles que também querem melhorar, e não querendo imitar nada do que fazemos, temendo imitar tudo.
[4] A Filosofia promete bom senso, humanidade e sociabilidade; mas, se nos diferenciarmos muito dos outros na maneira de viver, como poderemos dar-lhes prova? Lembra-te que com o comportamento queremos suscitar admiração e não provocar o riso e o desprezo. Certamente o nosso propósito é viver segundo a natureza: mas é contra a natureza atormentar o próprio corpo, abominar os mais elementares cuidados de higiene, procurar um aspecto horrendo e alimentar-se com alimentos pobres, nojentos e repugnantes.
[5] Como é agradável desejar coisas mais refinadas e por isso é louco para fugir das coisas comuns e de pouco apreço. A Filosofia exige simplicidade, não sofrimento; a simplicidade, por outro lado, pode ser acompanhada de um certo decoro. Me parece justo este critério de medida: a vida combina na justa proporção os costumes do sábio e aqueles da gente comum. Para que todos admirem o nosso modo de viver, e também possam compreender lo.
[6] “E agora? Se comportamo-nos como os outros? Não haverá diferença entre nós e eles?” Haverá muita: quem nos observar atentamente compreenderá que somos diferentes das massas; quem adentrar a nossa casa nos admirará mais do que o nosso mobiliário. Como é nobre aquele que sabe servir-se de pratos de terracota como se fossem de prata, também não é menos certo que se pode servir-se de pratos de prata como se fossem de terracota; é próprio de uma alma débil o não saber suportar a riqueza.
[7] Mas quero compartilhar contigo também o pequeno ganho desta jornada; ler em nosso Hecatão que parar de ter desejos é um bom remédio contra o medo. “Cessarás”, diz ele, “ de ter medo, se cessares de esperar”. Tu me dirás: “como é possível que coisas tão diferentes estejam juntas?” Entretanto é assim meu Lucílio: parece está em contraste, e, ao invés disso, são intimamente conectados. Assim como a cadeia une tanto o prisioneiro quanto seu carcereiro, assim também estas coisas que são tão diferentes procedem de pari passo: o temor tem dentro de si a esperança.
[8] E não me admiro que as coisas se passem assim: ambos estes sentimentos são próprios de um espírito hesitante e ansioso que espera o futuro. A causa primeira de ambos é que não se adaptamo-nos ao presente, mas antecipamo-nos com o pensamento aquilo que ainda está longe; desse modo a capacidade de fazer previsões, que é um bem supremo da condição humana, se transforma em um mal.
[9] Os animais fogem dos perigos que vêem, e uma vez que escapa sentem-se seguros: nós nos deixamos atormentar pelo futuro e pelo passado. Muito dos nossos bens não são prejudiciais; revisitar o passado com o pensamento e estender a mão para o futuro que o antecipa renova o tormento da incerteza; nenhum homem é infeliz somente por causa dos males presentes.

Fique bem!